Por quĂȘ o mundo precisa DE mais facilitadores?
- Gabriela Moreira
- Jul 12, 2022
- 8 min read
Updated: Oct 9, 2023
Por quĂȘ a facilitação Ă© uma habilidade revolucionĂĄria e para qualquer pessoa?

Estamos em um contexto em que temos a maior quantidade populacional da histĂłria e ao mesmo tempo temos o maior Ăndice de solidĂŁo de todos os tempos. Por quĂȘ mesmo rodeados de tantas pessoas nos sentimos sĂł?
Existem infinitas respostas para essa questão: Byong em a sociedade do cansaço diria que é o senso de individualidade que vem causando isso, os geógrafos diriam a globalização e o fato de como as cidades verticalizadas não permitem a criação de comunidades. Nesse artigo, entretanto, vou me ater a uma coisa: o design.
Existe um design "invisĂvel" por trĂĄs de todo contexto que visitamos ou vivemos, regras que compĂ”em aquele espaço. A maior parte delas nem estĂŁo postas, nem sabemos que Ă© uma "regra".
Porque vocĂȘ entra em uma sala e diz bom dia e nĂŁo qualquer outra coisa? Por que no supermercado vocĂȘ nĂŁo pede desconto mas na hora de comprar um curso sim? Por que na festa do trabalho vocĂȘ vai com um tipo de roupa e em casa vocĂȘ usa outras roupas? Existem milhares de coisas que fazemos, nos mais diversos espaços, que nem nos damos conta do por que fazemos. Fazemos apenas por estar no senso comum, porque Ă© daquela forma, porque sempre foi assim. Isso nĂŁo Ă© ruim, nem Ă© bom e o fato de nĂŁo colocar isso em nenhuma dessas duas categorias nos permite experienciar e ir mais fundo.
Pensa em um jogo que vocĂȘ curtia quando criança ou que ainda hoje te anima. Como ele funciona? Como ele foi criado? Quem criou? Quem fez as regras dele? Quem disse que sĂł pode jogar a bola com o pĂ©? Comumente, nĂłs apenas recebemos o jogo pronto e jogamos, nĂŁo participamos da construção dele, nĂŁo temos a possibilidade de modificĂĄ-lo Ă medida que Ă© jogado. Apenas se joga. E o que isso tem a ver com a situação da solidĂŁo que trouxe no inĂcio do texto?
Nos foi dado um tabuleiro de jogo da competição, da individualidade, da hierarquia. E nĂłs apenas jogamos esse jogo. Se vocĂȘ parar para observar existem inĂșmeras coisas projetadas e desenhadas para que nĂŁo haja coletividade, comunidade: as telas, o formato quadrado das mesas, salas de aula em fileiras, carros e mais carros, prĂ©dios em que vocĂȘ nem conhece o vizinho.
Tem uma frase do nosso amigo Winston Churchill que adapto aqui para: NĂłs moldamos nossos espaços e depois eles nos moldam. Nossos espaços, cultura, ambiente, pessoas, nos influencia muito mais do que imaginamos. Em um texto de um moço que muito admiro, Alex Bretas, ele traz como Ă© um mito o fato de apenas a mentalidade, o tal do mindset, moldar nosso comportamento. "A Ideia da Mentalidade Que Move Montanhas se esquece do fato de que nĂłs imitamos o que outras pessoas pensam e fazem, somos atravessados pelas emocionalidades de nossas comunidades (apreciação e julgamento, por exemplo), procuramos nĂŁo sair do padrĂŁo em quase tudo e vivemos nossa realidade de maneira gregĂĄria. NĂŁo Ă© que o mindset nĂŁo seja importante â Ă© que outras coisas sĂŁo consideravelmente mais importantes."
Temos nossas vidas moldadas por pessoas, estruturas e propĂłsitos que atĂ© mesmo desconhecemos. Por exemplo, o propĂłsito de hierarquia que estĂĄ presente em quase todos os lugares. Se tivĂ©ssemos consciĂȘncia disso e sentĂssemos a dor que isso causa em nĂłs e nos outros esse propĂłsito nos espaços jĂĄ teria se transformado, jĂĄ terĂamos deixado de ver uma pessoa "famosa" passar por nĂłs e tratĂĄ-la como superior a nĂłs. O design tem um papel fundamental nisso tudo, porque a partir dele recuperamos o poder de redesenhar o tabuleiro do jogo que jogamos, nĂŁo a partir apenas da mentalização, mas sim da ação, do ambiente, dos sentimentos, das relaçÔes;
E o que design e a facilitação tem relação com tudo isso atĂ© aqui? TUDO! VocĂȘ jĂĄ jĂĄ vai entender.
No artigo Metadesign, Jogos e Tranformação Cultural, Caio VassĂŁo traz 4 papĂ©is que acontecem em diferentes espaços da vida e da sociedade, e que vai ser muito Ăștil para chegarmos a: o que Ă© um facilitador, qual a relação disso com design e por que facilitação Ă© uma habilidade revolucionĂĄria e o mundo precisa mais disso. Esses papĂ©is sĂŁo: "o jogador", "o arbitro", "o inventor" e o "facilitador".
O jogador Ă© aquele/aquele quem experimenta o jogo, a realidade. Ele faz isso aprendendo, mesmo que rapidamente e superficialmente, as regras do jogo. O jogador faz parte desse contexto como sendo parte dele, e dependendo da qualidade desse jogo, pode atĂ© esquecer que estĂĄ em um jogo e que pode mudar de jogo a qualquer momento. Ă como quando vocĂȘ entra em uma sala de cinema e se vĂȘ totalmente dentro do filme, como se vocĂȘ estivesse lĂĄ.
O ĂĄrbitro Ă© aquele que garante que as regras do jogo sejam respeitadas e que a âilusĂŁoâ de estar em um jogo nĂŁo seja desvendada. Na maior parte dos contextos, o papel do ĂĄrbitro estĂĄ distribuĂdo entre os jogadores â todos os jogadores se observam mutuamente e garantem que as regras sejam respeitadas. Quando vocĂȘ veste uma roupa diferente para ir pro trabalho, por exemplo, e seu chefe te adverte. NĂŁo foi ele quem criou essa regra "use o uniforme", mas mesmo assim estĂĄ assegurando que ela seja cumprida e que a "ilusĂŁo" de jogo trabalho nĂŁo seja destruĂda.
O terceiro papel é quase sempre esquecido porque como quase todos nós fomos para a escola, pensamos que não podemos desempenhå-lo, que é o INVENTOR. Acreditamos, mesmo que em nosso inconsciente, de que é um papel especial, que não somos bons o suficiente para criar algo e ele é provavelmente reservado para pessoas especiais e/ou em posiçÔes sociais especiais. O inventor é quem desenha o contexto, o mundo de jogo como chamamos no Possibility Managment (em breve vai sair um texto sobre isso também), as regras e os limites do jogo.
SĂŁo 3 escolhas que nos sĂŁo apresentadas. Ou eu invento o contexto, ou eu julgo se as coisas que estĂŁo acontecendo nele estĂŁo de acordo com as regras ditadas pelo inventor ou eu apenas jogo e aceito que as regras sĂŁo aquelas, e na sociedade patriarcal em que vivemos, somos incentivados a basicamente sermos jogadores.
Isso em uma empresa "normal", como temos hoje seria: O cara (99% das vezes branco, hétero) que cria o mundo de jogo da empresa, as regras, o que vai ser, como as coisas acontecem, o inventor. Tem os "coordenadores", gerentes que vigiam e asseguram que os jogadores não vão descumprir com as regras escritas. E por fim, tem os jogadores que conhecem as regras, e às vezes nem tanto assim, e jogam esse jogo, como peÔes em um tabuleiro.
E qual o problema dessa estrutura? O que estĂĄ faltando nela?
O problema Ă© que ela nĂŁo acompanha o design maior, o design da natureza. E qual Ă© o design da natureza? Transformação, mudança, evolução. A todo momento a natureza estĂĄ se transformando. Se vocĂȘ tirar 20 minutos do seu dia para observar um pĂĄssaro, uma ĂĄrvore, um rio, vocĂȘ com certeza vai conseguir enxergar isso. Essa estrutura que quase todos os espaços que a espĂ©cie humana construiu e habita estĂĄ desenhada com propĂłsitos hierĂĄrquicos, destrutivos e genocidas. Esse design que projeta e constrĂłi os espaços hoje mata a natureza que hĂĄ em nĂłs, suga o nosso poder inato, deixa o solo totalmente infĂ©rtil para nos transformar, evoluir e criar.
VocĂȘ pode olhar, nas escolas, empresas, supermercados, parques, academias, temos jogadores, ĂĄrbitros e inventores. E que outra possibilidade temos alĂ©m disso? Que outro papel estĂĄ tentando ser apagado?
O papel da facilitadora, do facilitador.
O facilitador ou amparador de espaços (como chamamos no contexto do Possibility) tanto atua como jogador, tanto ĂĄrbitro e tanto como (re)inventor do jogo, da realidade, do mundo de jogo. O facilitador joga o jogo, ele percebe como o jogo estĂĄ se desenrolando. Atua tambĂ©m como observador das "regras" daquele espaço e garante que a coerĂȘncia e a coesĂŁo desse jogo se mantenha durante a experiĂȘncia. No entanto, quando alguma dessas regras jĂĄ inventadas nĂŁo estĂŁo dando conta do que estĂĄ rolando â algo âdĂĄ erradoâ, os tempos nĂŁo estĂŁo sendo suficientes, o que estĂĄ sendo proposto nĂŁo funciona â o facilitador atua como INVENTOR, e altera ou ajusta as regras e os elementos do jogo para que a qualidade do espaço seja restabelecido, para que a evolução aconteça, para que a transformação prospere.
Apesar de ser uma nomenclatura contemporĂąnea, ela estĂĄ, na verdade, ligada a um papel muito antigo e profundo, que Ă© comumente excluĂdo das atividades do mundo atual, por um motivo Ăłbvio: As pessoas que estĂŁo no topo da hierarquia nĂŁo querem que o jogo seja reinventado, pois assim, eles sairiam do poder!
E o que o FACILITADOR faz na prĂĄtica? "O facilitador Ă© aquele que conduz a atividade, observa a qualidade da interação entre as pessoas, se baseia nas âregrasâ (propostas por ele ou ela mesma, ou propostas por outras pessoas). E, caso perceba que a interação nĂŁo estĂĄ correndo com a qualidade que poderia, o facilitador interfere na situação em andamento â atĂ© mesmo nas âregras do jogoâ â para que a interação aconteça com o mĂĄximo de qualidade." (Caio VassĂŁo)

(Imagem retirada do artigo do Caio VassĂŁo)
O FACILITADOR tem uma experiĂȘncia âcosmolĂłgicaâ da vida, ele experiencia o jogo no âquenteâ, enquanto ele estĂĄ ârodandoâ, âno momentoâ, ele Ă© o metadesign da vida (Caio VassĂŁo). Ele Ă© o guardiĂŁo do propĂłsito daquele contexto, experiĂȘncia, realidade. Ele nĂŁo vĂȘ as coisas de fora, afastado como inventor, ele pelo contrĂĄrio, inventa novas regras com o jogo em andamento, sem ter que âpausĂĄ-loâ, ele observa as consequĂȘncias da sua intervenção logo em seguida, no momento presente. O facilitador faz as mudanças a partir de dentro da experiĂȘncia, e por isso mesmo tem consequĂȘncias diretas para o andamento naquela realidade. Ele compreende suas possibilidades criativas de intervir no âcalor do momentoâ, estĂĄ comprometido com o propĂłsito do espaço. Assume responsabilidade radical por ser guardiĂŁo do propĂłsito e sustentĂĄ-lo.
TĂĄ, ok! Bonito o discurso, mas como fazer isso? Como deixarmos de sermos jogadores, ĂĄrbitros e inventores e passarmos a sermos facilitadores? Para sermos facilitadores precisamos nos tornarmos seres humanos conscientes. Precisamos desenvolver uma sĂ©rie de habilidades nas quais a maior parte de nĂłs somos analfabetos, porque nĂŁo aprendemos isso nas escolas ou universidade. Algumas dessas habilidades sĂŁo: presença, centramento, divisĂŁo de atenção, conexĂŁo com os sentimentos, criação de espaço energĂ©tico, clareza, princĂpios brilhantes, clareza de propĂłsito...
Por isso quando digo facilitador, não falo apenas das pessoas que "facilitam" encontros (e que na maior parte das vezes não facilitam de verdade, agem mais como årbitros/ professores), mas falo de seres humanos conscientes de seus propósitos e empoderados de sua própria natureza. Não precisamos de facilitadores apenas nos espaços de aprendizagem (mas também). Precisamos de facilitadores nas casas, nas vilas, nas escolas, nos hospitais, nas universidades, nas ruas.
O Possibility Management traz ferramentas poderosas para que essas habilidades possam ser desenvolvidas e para que vocĂȘ possa conseguir criar espaços nĂŁo apenas para os outros, mas tambĂ©m na sua vida, de forma extraordinĂĄria e transformacional. Pensando nisso, quero compartilhar um pouquinho do que venho aprendendo e vivendo sobre facilitação nesses Ășltimos tempos desse lugar que trago neste texto. Facilitar como um ato revolucionĂĄrio e transformador de reconexĂŁo com a nossa natureza interna e de redefinição do nosso tabuleiro de vida.
Se vocĂȘ quer saber mais sobre isso, te convido a participar da oficina online que vai rolar no dia 26 de julho, terça-feira. Das 19h Ă s 21h. O tema serĂĄ: Por quĂȘ a facilitação Ă© uma habilidade revolucionĂĄria e para qualquer pessoa?
Para se inscrever e experimentar na pele esse tema clique aqui!
Com amor e aventura, Gabriela
